De acordo com o art. 53, § 1.º, os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o STF, pela prática de qualquer tipo de crime, seja de natureza penal comum stricto sensu, seja crimes contra a vida, eleitorais, contravenções penais (art. 53, § 1.º, c./c. art. 102, I, “b” — infrações penais comuns).
Estamos diante do tópico sobre a competência por prerrogativa de função, envolvendo as regras do art. 84 do CPP.
Às pressas, inusitadamente, foi publicada a Lei n. 10.628, de 24.12.2002, que, ao dar nova redação ao art. 84 do CPP, “ressuscitou” a já banida e execrada regra da perpetuatio jurisdictionis após o término do mandato das autoridades. Em nosso entender, a nova regra, retrógrada, ao manter o foro privilegiado para os crimes praticados durante o mandato, é flagrantemente inconstitucional, já que veiculada por lei ordinária e não por emenda constitucional, ferindo, desta feita, o princípio da separação de Poderes.
Esse nosso entendimento foi confirmado no julgamento das ADIs 2.797 e 2860 (cf. Inf. 401/STF).
Dessa forma, a regra que prepondera no STF é aquela segundo a qual a prerrogativa de foro depende do efetivo exercício parlamentar.
Não exercendo mais a função parlamentar, o ex-Deputado ou ex-Senador passa a ser julgado pela Justiça comum.
Tendo em vista essas premissas, lembramos a renúncia do ex-Deputado Federal RCL (PSDB-PB), que, nos autos da AP 333, estava sendo acusado do crime de homicídio qualificado, na modalidade tentada, contra o ex-Governador da Paraíba, TB, por ter, conforme narra a denúncia, efetuado disparos de arma de fogo em um restaurante de João Pessoa.
De acordo com o relatório da referida ação penal, ao tempo dos fatos, o denunciado (RCL) era Governador do Estado da Paraíba. Por esse motivo, a denúncia foi oferecida perante o STJ (art. 105, I, “a”).
RCL, nas eleições de 1994, elege-se Senador da República, e nas duas eleições que se seguiram, Deputado Federal, sendo que o seu último mandato terminaria em 31.12.2010.
Assim, sendo ele parlamentar federal, nos termos do art. 53, § 1.º, já estudado, expedido o diploma, a competência para julgar RCL passou a ser do STF (muito embora ao tempo dos fatos — 05.11.1993 — fosse Governador da Paraíba).
Durante a ação penal (tendo sido a denúncia recebida em 2002), houve amplo direito de defesa, e se tentou ouvir uma testemunha por mais de 1 ano.
Em 31.10.2007, faltando 5 dias para o início do julgamento, já marcado pelo STF, RCL renunciou ao mandato de Deputado Federal (legislatura 2007-2010).
A polêmica se instaurara. Não sendo mais Deputado Federal, ou seja, passando a ser uma pessoa comum, o STF deixava de ser competente, conforme a orientação firmada a partir do cancelamento da S. 394 e, também, ao se declarar inconstitucional a Lei n. 10.628/2002?
Ao final, em 05.12.2007, por 7x4, o STF julgou que a competência do Supremo cessava ao ter RCL deixado de ser Deputado Federal, mesmo na hipótese de renúncia. Segundo afirmou Celso de Mello, invocando o princípio do juiz natural, a renúncia é inquestionável. “Foi recebida e gerou efeitos, antes do julgamento final do processo em curso, sendo um desses efeitos a cessação da competência do STF para julgá-lo” (Notícias STF, 05.12.2007).
Por esse motivo, passando a ser pessoa comum, sem prerrogativa de foro, os autos foram remetidos para o Juízo Criminal da Comarca de João Pessoa.
O tema da prerrogativa de foro, contudo, de maneira muito acertada, veio a ser reanalisado pelo STF em outro caso polêmico, qual seja, a AP 396, julgada em 28.10.2010 e que, até o fechamento deste artigo ainda não havia transitado em julgado.
De acordo com as informações públicas contidas no site do STF, apurava-se suposto esquema a caracterizar os crimes de formação de quadrilha e peculato, envolvendo, dentre outros, o ex-deputado federal ND (PMDB-RO) (Inf 606/STF e Notícias STF, de 28.10.2010) que, inclusive, reeleito, obteve liminar do Min. Celso de Mello, suspendendo os efeitos de decisão do TSE, que o enquadrou na denominada Lei da Ficha Limpa (LC 135/2010), indeferindo, assim o seu registro de candidatura para as eleições de 2010, em outro processo que não o em estudo, para que pudesse tomar posse na nova legislatura (AC 2763, j. 17.12.2010 – Notícias STF da mesma data – matéria pendente).
No caso em referência, a denúncia foi oferecida em 24.06.99 pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado de Rondônia, porque ainda não havia a prerrogativa de foro. Contudo, em 03.01.2005, ND tomou posse como Deputado Federal, para exercício do mandato na Legislatura 2003-2007, quando, então, por esse motivo, o juiz da 3.ª Vara Criminal da Comarca de Porto Velho (RO) determinou o desmembramento dos autos com a remessa do processo, para o STF, em razão da prerrogativa de foro.
A ação foi distribuída, no STF, em 16.08.2005 e, às vésperas do julgamento, qual seja, em 27.10.2010, o Deputado Federal renunciou ao mandato, sendo que o crime prescreveria no dia 04.11.2010.
Então vejamos o cronograma dos fatos:
· 24.06.99 – oferecimento de denúncia na comarca de Porto Velho;
· 03.01.2005 – posse como Deputado Federal;
· 16.08.2005 – a ação é distribuída no STF;
· 27.10.2010 – o Deputado Federal renuncia ao mandato;
· 04.11.2010 – haveria a prescrição do crime.
Revendo o julgamento proferido no caso do ex-Deputado Federal RCL (AP 333), no qual o STF, por 7 X 4, entendia que a renúncia (no caso faltando 5 dias para o julgamento) era válida e, assim, cessaria a competência do STF, por 8 X 1, modificando o seu entendimento, decidiu, em 28.10.2010, julgar a ação, mantendo a sua competência, mesmo não sendo mais o réu Parlamentar.
Temos, assim, um novo entendimento do STF, que, em nosso entender, mostra-se muito acertado, buscando-se, assim, evitar inconcebível fraude processual.
PEDRO LENZA
Explendoroso
ResponderExcluirPedro lenza , autor muito requisitado no curso de DIREITO DA ULBRA SANTARÉM
ResponderExcluirmuito clara a explicação
ResponderExcluir!